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sábado, 25 de outubro de 2014

A encantadora história do circo

Adailtom Alves Teixeira[1]

O circo sempre encantou por colocar o ser humano em seus limites, seja os do ridículo, como fazem os palhaços, seja os do extraordinário, como os trapezistas. Mas ser um artista circense sem nascer no mundo do circo é algo bastante recente na história dessa arte no Brasil. Até a década de 1980 para aprender a arte circense era necessário pertencer a uma família dita “tradicional” ou fugir com o circo, como se dizia. Tudo isso é passado e hoje muitas são as possibilidades de se adentrar o mundo da arte circense e o Circo Teatro Palombar, composto por jovens artistas é a demonstração clara dessa mudança.
Fruto de um projeto criado no Centro Cultural Arte em Construção – sede do Pombas Urbanas em Cidade Tiradentes, situado no limite leste da cidade de São Paulo – e coordenado por Adriano Mauriz, o coletivo é formado por jovens que dominam diversas técnicas: malabares, monociclo, pirofagia, trapézio, contorção, mágica, mas sobretudo, a técnica do palhaço, elo de ligação entre as demais. O projeto que deu origem, o Somos do Circo, foi criado em 2005, mas os aprendizes formaram o coletivo em 2012, com o objetivo de estudar a história do circo e seu entorno, isto é, saber se em seu bairro havia pessoas ligadas ao mundo do circo. Dessa forma, nasceu o espetáculo Nós na Lona – uma arriscada trama de picadeiro e asfalto.
A história é bastante simples, porém eficiente, visa passar em revista toda a história do circo, desde a antiguidade chinesa e greco-romana, passando pelos saltimbancos medievais, os cômicos dell`arte, chegando ao circo moderno com Philip Astley. A cada momento histórico um número circense é apresentado. Quem conta a história é um mestre de cerimônias já cansado de sustentar a tradição. Conta para um “vendedor ambulante”, que ao longo da história vai se apaixonando pela história, ao mesmo tempo em que vai se tornando um palhaço.

O espetáculo apresentado na 8ª Mostra de Teatro de Rua Lino Rojas, no dia 03 de dezembro de 2013, criou uma roda em torno de si de mais de 500 pessoas, que ficaram maravilhadas, tanto pela destreza dos números apresentados, como pela força daqueles jovens artistas. Não é um espetáculo curto, tem mais de hora de duração, ainda assim, o público não arredou pé, mesmo nos momentos mais frágeis, como, por exemplo, em cenas de muitas falas e em que a voz dos artistas não chegam a todos. O espetáculo parece ter sido criado pensando uma cena pequena, para poucas pessoas, por outro lado, a estrutura de banda (charanga), trapézio e cenário são grandiosos, criando certa contradição, entre o que se propõe e o que se apresenta enquanto estrutura. Porém, toda a espetacularidade do circo está presente. Os jovens se desnudam artisticamente, é um espetáculo muito verdadeiro e que apresenta toda a paixão de seus criadores pelo mundo do circo, uma bela homenagem, inclusive, reverenciam os nossos grandes palhaços como os Picolinos (Roger Avanzi, Nerino Avanzi e Roger Avanzi Filho).
O público, encantado, vê até o que não é mostrado, como uma senhora que estava com sua filha ao ver um beijo falso entre a índia Potira (Esmael Ferreira) e uma pessoa do pública, chamada a participar da cena. A senhora afirmou: “não é que ele beijou a boca dela mesmo!” Nem houve beijo e nem era ela, mas a verdade é tamanha que convenceu a assistente, que depois chamou sua filha para ir embora, mas a menina se recusou, assim, ficaram até o final do espetáculo.
No espetáculo, a todo momento, os artistas buscam a participação do público. O momento alto é no malabares com os facões e no número com as facas. O primeiro pela destreza, o segundo pelas brincadeiras de palhaços durante a execução do número, tornando o público cúmplice na armação. As tiradas de palhaço, as armações em que tornam o público cúmplice das trapaças, deixam o espetáculo excessivamente delicioso.
O momento frágil é quando tratam da commedia dell`arte, apesar do treinamento corporal, a cena não mostra os tipos e uso da máscara não é bem utilizado. Poderiam também encurtar um pouco toda a história, o que tornaria o espetáculo ainda mais dinâmico. Mas, é importante lembrar que se trata do primeiro espetáculo da trupe, logo, é certo que irão crescer bastante.
No momento de passar o chapéu, o primeiro a contribuir foi um senhor que participou bastante, intervindo nas cenas, colocou suas moedas e fez questão de beijar a índia Potira. Retribuiu a gentileza de ser bem recebido e aceito por todos daquela trupe. O coletivo, coordenado por Adriano Mauriz, é composto por Esmael Ferreira, Guilherme Silveira, Henrique Nobre, Leonardo Galdino, Letícia Cássia, Marcelo Nobre, Paulo Wesley, Rafael Garcia, Telber Victor e conta com a participação de Juliana Flory e Cinthia Arruda.




[1] Ator e diretor teatral; mestre em Artes pelo Instituto de Artes da Unesp e membro do Núcleo Paulista de Fazedores e Pesquisadores de Teatro de Rua; integrante do Buraco d´Oráculo.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Revista Arte e Resistência na Rua


Enfim, a Revista "Arte e Resistência na Rua" está de volta à praça, neste caso, à praça virtual, conectada pela rede mundial de computadores. Após um intervalo de dois anos sem publicação, compartilhamos a edição nº 4, que traz textos de reflexão teórica, relatos de ações de militância e leituras críticas dos espetáculos apresentados na 6ª Mostra Lino Rojas, realizada em novembro de 2011.
A trajetória da Revista, que teve sua primeira edição em 2009, é retomada, dando continuidade aos processos de formação de críticos em diálogo direto com os fazedores teatrais e de registro do fazer teatral de rua. Esforço, sempre bom lembrar, militante, que conta com o trabalho voluntário de artistas, estudantes de graduação e pós-graduação reunidos em torno do Núcleo Paulistano de Pesquisadores e Fazedores de Teatro de Rua e do Grupo de Pesquisa "Crítica aos espetáculos de rua", ambos sediados no Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista – UNESP e coordenados pelo professor Alexandre Mate. Além, é claro, de toda a articulação e iniciativa do Movimento de Teatro de Rua de São Paulo, realizador das sucessivas edições da Mostra Lino Rojas, que já se inscreveu no calendário cultural paulista e quiçá nacional.
Um destaque desta edição é a inclusão de artigos de aprofundamento teórico acerca de temas caros à produção teatral de rua, como as questões de espaço e território e da palhaçaria. A Revista se expande, se aprofunda e se enraíza entre os teatristas, pesquisadores e apreciadores desta arte, fornecendo alimento para o contínuo amadurecimento de uma práxis de potencial emancipatório, que implica a ocupação e a ressignificação dos espaços públicos, na contramão da mercantilização que impera na sociedade. Que a Revista possa ser mais uma trincheira na luta pelas artes públicas e por um mundo mais digno e justo! Boa leitura.

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

VII FESTAC - Festival Nacional de Teatro do Acre - Regulamento

                                                         FEDERAÇÃO DE TEATRO DO ACRE
               Entidade de Utilidade Pública
              Endereço: Rua Floriano Peixoto, 970 - Centro.
              E-mail: novofetac@yahoo.com.br - fone: 3244-2554
                                    CNPJ - 04.109.542/0001-58


VII FESTAC - FESTIVAL NACIONAL DE TEATRO DO ACRE


REGULAMENTO


I – PROMOÇÃO E OBJETIVOS


Art. 1º - A Federação de Teatro do Acre - FETAC, promoverá o VII Festival Nacional de Teatro do Acre, de 21 a 28 de março de 2015, com financiamento da Fundação Estadual de Cultura e Comunicação Elias Mansour - FEM, através do Edital de Incentivo Direto/PRECULT/FUNCULTURA, Fundação Garibaldi Brasil através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura e do SESC, com o intuito de estimular e difundir a produção Teatral do Estado, promover o intercâmbio entre os artistas e grupos locais e de outros estados da federação, além de facilitar o acesso da comunidade e formação de público.

Art. 2º - O VII FESTAC compreenderá as seguintes atividades dentro da Mostra Oficial e Atividades Paralelas:
a)    Mostra Oficial com 08 espetáculos de Teatro para Palco e Rua inéditos no FESTAC, vindos de outros Estados da Federação (desde que atinjam número igual ou superior de inscrições e atendam as exigências de qualidade artística), e outras formas de produção não citadas como convidados;
b)   Debates após os Espetáculos;
c)    Demonstrações de Trabalhos aplicadas pelos Grupos Convidados;
d)   Mostra Semana do Teatro com participação de Grupos Locais;
e)    Encontro Estadual de Teatro de Grupos;





II – INSCRIÇÕES

Art. 3º - Poderá se inscrever qualquer Grupo de Teatro com atuação no território Nacional, em formulário próprio do FESTAC, desde que convidado pela Federação de Teatro do Acre, indicados pelos Grupos filiados, ou inscritos que poderão ser convidados pela Coordenação do FESTAC 2015.
Parágrafo ùnico: Só poderão se inscrever para a Mostra Semana do Teatro 2015, os Grupos ou Companhias do Estado do Acre, com um único espetáculo, inédito no FESTAC, que tenham solicitado sua filiação junto a FETAC até 15 de dezembro de 2014.

Art. 4º - As inscrições dos grupos interessados, que queiram ser convidados, poderão ser feitas pelo Endereço Eletrônico festac2015@gmail.com, entregues ou enviadas para o endereço:
              

FETAC - Federação de Teatro do Acre
Setor Artístico Cultural do SESC – Acre
A/C Marques Izítio
               Coordenação do 7º FESTAC
               Avenida Brasil, 713 - Centro.
               CEP 69.900-076    Rio Branco - AC.

Art. 5º - As inscrições para o VII FESTAC deverão ser feitas impreterivelmente até o dia 15 de dezembro de 2014.

Parágrafo 1º - Para o material de inscrição postado via Correio, prevalecerá a data de postagem até a data de encerramento das inscrições.
Parágrafo 2º - As Inscrições deverão ser feitas através de formulário próprio do Festival.
Parágrafo 3º - As inscrições encaminhadas após a data de encerramento prevista neste regulamento serão consideradas sem efeito.
Parágrafo 4º - Os grupos locais, inscritos para Mostra Semana do Teatro 2015, deverão estar com sua filiação em dia até o dia 15 de dezembro de 2014 contendo: Ficha Cadastral de Filiação, histórico do grupo atualizado, contatos, e-mail, integrantes, portfólio do Grupo/Companhia atualizado, etc.

Art. 6º - As fichas de inscrições deverão vir obrigatoriamente, acompanhadas de projeto de participação no VII FESTAC, ou para Mostra Semana do Teatro 2015, atendendo as seguintes exigências:
  Uma cópia do Texto ou Roteiro;
  Sinopse do espetáculo;
  Proposta de encenação;
Fotos de cenas do espetáculo com qualidade - 300 DPI, (no       mínimo três);
  Material de divulgação
        Currículo do Grupo ou Cia;
              Projeto de montagem do espetáculo (ficha técnica completa, mapa de luz, recursos para sonoplastia, palco ou Rua);
Autorização de apresentação expedida pelo autor, ou pela SBAT - Sociedade Brasileira de Autores Teatrais, ou ABRAMUS - Associação Brasileira de Música e Artes.
Comprovação de temporada realizada até 15 de dezembro de 2014, acompanhado de documentação comprobatória.

Parágrafo 1º - Todo material constante no Art. 6º, não será devolvido aos inscritos e passará a fazer parte do acervo da FETAC.
Parágrafo 2º - Somente os participantes de outras cidades, que constarem do formulário de inscrição, terão direito à hospedagem e alimentação.
Parágrafo 3º - Os grupos que possuem menores de idade como integrantes, deverão portar uma autorização dos pais e/ou responsáveis legais.
Parágrafo 4° - As inscrições deverão conter a função de cada membro do grupo.

Art. 7º - Fica facultado a Coordenação do FESTAC, em comum acordo com o Conselho Diretor da FETAC, convidar espetáculos de outros estados, regiões e Países vizinhos objetivando a organização política e fortalecimento do teatro, desde que não acarretem despesas que contrariem o presente regulamento.  

Parágrafo Único – Poderão ser convidadas Entidades/Coletivos da Amazônia (Federação de teatro, Rede de Teatro e Fóruns Permanentes), através de suas representações legais, a fim de contribuir para o fortalecimento do fazer teatral na região norte.


III – DA SELEÇÃO

Art. 8º - A Escolha dos espetáculos será realizada pelo Conselho Diretor da FETAC, com base em seu Estatuto e Regimento Interno, constituída de 01 representante por Grupo junto ao Conselho, que terão poder de indicar, defender e escolher por consenso os Espetáculos, que serão convidados a integrar a programação do VII FESTAC e da Mostra Semana do Teatro 2015.

Parágrafo Único - Para as decisões da Seleção pelo Conselho de Grupos não caberão recursos de natureza jurídica ou administrativa.

Art. 9º - Os espetáculos Convidados serão comunicados por telefone, e-mail, e será enviada Carta Convite, imediatamente, de acordo com as informações mencionadas no Formulário de Inscrição, até dia 20 de dezembro de 2014.

Art. 10º - O Cronograma das apresentações será definido pela Coordenação do Festival de acordo com a situação geográfica, e será divulgado aos selecionados junto à imprensa até o dia 02 de janeiro de 2015.

Art. 11º - Caso o grupo seja convidado, deverá obrigatoriamente fazer a confirmação por escrito até 30 de janeiro de 2015, comprometendo-se a apresentar nos locais, horários e dias marcados, através da assinatura do Contrato de Serviço.          
  
Art.12º-Todos os integrantes dos grupos e equipe organização/técnica que atuaram diretamente no VII FESTAC receberão Certificados de Participação.
Parágrafo1º: A FETAC realizará no dia 19 de dezembro de 2014 Reunião Extraordinária do Conselho Diretor de Grupos, para escolha dos espetáculos que comporão a programação do VII FESTAC e da Mostra Semana do Teatro 2015.
Parágrafo 2º: Para garantir a participação de Espetáculos na Mostra Semana do Teatro 2015, os Grupos Locais, já filiados e recadastrados até 15 de dezembro de 2014, deverão participar da Reunião do Conselho Diretor da FETAC, em 19 de dezembro de 2014, no SESC – Centro, Teatro de Arena do SESC, as 17:00 horas.


IV – APOIO E REALIZAÇÃO

Art. 13º - As despesas decorrentes da participação dos grupos serão assim divididas:
a)           A Coordenação do Festival se responsabilizará pela hospedagem e alimentação do grupo durante os dias de realização da Mostra/Festival.
b)          Os grupos participantes da cidade de Rio Branco não terão direito a hospedagem e alimentação.
c)           É de responsabilidade da Coordenação do Festival, sem ônus para os grupos participantes, viabilizar os locais de apresentações com sistema elétrico (refletores) e sonoro, inclusive para os espetáculos de Teatro de Rua, quando se fizer necessário;
d)          O Festival garantirá um Cachê aos grupos convidados de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), por Espetáculo;
e)           O Cachê dos Espetáculos da Mostra Semana do Teatro serão definidos em reunião do Conselho Diretor de Grupos da FETAC;
f)           Será de total responsabilidade da produção dos Grupos convidados, providenciar o transporte de ida e volta a sua cidade de origem, da equipe e do material cênico;
g)          A Coordenação do Festival garantirá o transporte interno dos Grupos participantes.
Art. 14º - Os espetáculos deverão apresentar-se rigorosamente nos horários anunciados, salvo problemas publicamente conhecidos e, como tal, aceitos pela Comissão Coordenadora.
Art. 15º - A Comissão Coordenadora fornecerá apoio na composição de cenários, mas não se responsabilizará por equipe técnica de montagem e desmontagem de espetáculos.
Parágrafo Único – A desmontagem deverá ser feita imediatamente após as apresentações.

Art. 16º - Será realizada Atividade de Demonstrações de Trabalhos oferecida pelos Grupos/Companhias convidados participantes do VII FESTAC.
              
V – DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 17º - A participação no VII FESTAC implicará na plena aceitação de todos os itens deste Regulamento pelo Grupo inscrito e convidado.
Art. 18º - Os casos omissos deste regulamento serão resolvidos pela Coordenação do VII FESTAC, sob anuência do Conselho Diretor de Grupos da FETAC.

Rio Branco - AC, 20 de outubro de 2014.

Federação de Teatro do Acre


terça-feira, 21 de outubro de 2014

9º Fentepira

Debatedores confirmam presença
no Festival de Teatro de Piracicaba

A comissão organizadora do 9º Fentepira (Festival Nacional de Teatro de Piracicaba) confirmou a presença de dois debatedores para a mostra oficial. Trata-se da dramaturgista Fátima Saad e do doutor em história social Alexandre Mate. Entre 15 e 23 de novembro, eles participarão de bate-papos com as 10 companhias selecionadas.

Alexandre Mate, ao centro.

Os encontros ocorrem após os espetáculos, com a participação do público, um integrante da comissão organizadora do Fentepira e do curador da 9ª edição, o ator e diretor Roberto Rosa. O objetivo é que os grupos tenham acesso a uma análise apurada sobre suas produções e a plateia possa aprimorar o olhar sobre as várias formas do fazer teatral.

Fátima Saadi

Nesta edição serão apresentadas cinco peças adultas e uma infantil no Teatro Erotídes de Campos, além de quatro espetáculos de rua, sendo dois na área externa do Engenho Central e dois na Praça José Bonifácio. As companhias são dos Estados de São Paulo, incluindo capital e interior, Rio de Janeiro e Maranhão.

Para Fátima Saadi, a interlocução entre artistas-criadores e público ganha uma nova dimensão nos debates. "É muito importante para a equipe conhecer a variedade de opiniões a respeito do que foi mostrado e o modo pelo qual o espetáculo multiplica seus sentidos ao ser apresentado ao público", diz ela, que é dramaturgista do Teatro do Pequeno Gesto e editora da revista de ensaios Folhetim, e da coleção Folhetim/Ensaios.

Esta é a quinta vez de Alexandre Mate no Fentepira. Professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista), ele produzirá leituras críticas sobre os espetáculos, a exemplo do que fez nos anos anteriores. "Os festivais são raras oportunidades de contato com experimentos desenvolvidos no país e fora dele. Nos festivais como o de Piracicaba e alguns outros, além do contato com as obras, há um contato com o pensar e a interação concreta com os criadores."

Fátima define os debatedores como "espectadores profissionais", que percebem, compreendem e verbalizam as primeiras impressões dos espetáculos. Já Mate lembra que, além desse aspecto, os debates ampliam as possibilidades de leitura do fazer teatral. "O Fentepira promove um trabalho de formação de público, o que eu vejo com bons olhos", diz.

É também o que pensa o engenheiro mecânico Melquizedeque Nunes de Oliveira, de Limeira. No 8º Fentepira, em 2013, ele fez questão de permanecer em quatro debates, acompanhado da esposa. "A peça fica mais clara para quem a assistiu. É importante entender o processo de pesquisa dos atores e conhecer a o desenvolvimento dos espetáculos."

Todos os espetáculos do Festival possuem entrada gratuita, com retirada de ingressos uma hora antes das apresentações. A grade de programação está em fase de ajustes finais pela comissão organizadora, será divulgada em breve e poderá ser consultada no site www.fentepira.com.br e nas redes sociais. No blog oficial (www.fentepira.wordpress.com) é possível conferir uma entrevista com Fátima Saadi e Alexandre Mate, assim como a lista dos 10 espetáculos selecionados.

ESTUDANTES – Além de conhecer de perto o que está sendo produzido por companhias profissionais, o público também terá a possibilidade de desfrutar da 21ª Mostra de Teatro Estudantil, com espetáculos de autoria de grupos de teatro de escolas públicas, privadas ou de entidades do Estado de São Paulo. As apresentações serão realizadas Salão Nobre do Colégio Piracicabano, Teatro do Engenho e Sesi Piracicaba.

O 9º Fentepira é realizado pela Prefeitura do Município de Piracicaba, por meio da Semac (Secretaria Municipal da Ação Cultural), em parceria com o Sesi Piracicaba, Colégio Piracicabano, Senac Piracicaba, Unimep (Universidade Metodista de Piracicaba), Ponto de Cultura Garapa, Apite! (Associação Piracicabana de Teatro), Rádio Educativa FM, Secretaria Municipal da Educação e Centro de Comunicação Social.

ASSESSORIA DE IMPRENSA DO 9° FENTEPIRA


domingo, 19 de outubro de 2014

MEMÓRIA PRESENTE V


DIA 01 DE SETEMBRO
SEGUNDA  
Primeiro dia do Ocupa Nise 2014. O primeiro dia não é fácil, pessoas chegando, dando nomes, sendo hospedadas, se localizando. O grupo de acolhimento passava informações enquanto os nomes eram conferidos na listagem: “Meu nome tem que estar na lista... Fui confirmado... Em qual andar eu fico?”. Movimentação normal, pois era apenas o inicio do encontro. No quarto andar do Hotel da Loucura, um café reforçado para os participantes e também para os que tinham chegado um dia antes. Mais foram chegando, com mochilas e colchonetes, ocupando os quartos e os que trouxeram instrumentos, pegaram seus violões, tambores, pandeiros, sanfonas e a celebração teve inicio, com muito canto e dança, e como não poderia deixar de ser, estando no Rio de janeiro, espaço para o samba e para as marchinhas de carnaval. A dramaturgia começa a ser escrita neste momento.
  
O primeiro movimento estava se manifestando, a concentração para o cortejo de abertura. Houve o almoço, mas não houve pausa, a ansiedade para a abertura era imensa. Começamos a nos preparar dentro do espaço fechado do hotel. Máscaras, cores, fantasias e instrumentos. Ali o ritual deu seu corpo, com os participantes se conhecendo e se reencontrando, preparando o espírito e o sentimento. Os internos do Nise riam e dançavam conosco, uma energia boa... Podíamos sentir isso através dos internos, pois eles acabam por serem canais naturais, se tivesse uma energia ruim, não estriam pulando e cantando com o povo. E assim, levantando as bandeiras e os estandartes, começamos a caminhar em direção ao local onde se daria a abertura. Descemos as escadas no balanço do cortejo. Saímos do hotel da loucura e nos dirigimos para a Praça Nei Matogrosso, praça está adotada pelo cantor que esteve presente no Ocupa Nise 2013, compartilhando sua arte e sua inteligência. Um amigo que se pode contar e um admirador com conhecimento da história da doutora Nise da Silveira. E foi cortejando o Instituto e os seus integrantes e clientes que entramos na pequena, mas aconchegante Praça Nei Matogrosso.

  
Evento de arte Pública em um lugar de saúde pública
Chegando a praça, nos preparamos para o primeiro diálogo do evento. Presentes para dialogar com os participantes: Amir Haddad, Vitor Pordeus, Heloisa Buarque de Hollanda e Professor Francisco Gregório Filho. Após muita música e intervenções poéticas, sentamos para escutar os convidados, pois como foi dito, é bom tocar os tambores, mas é bom sentar para dialogar, avaliar, entender o que está acontecendo. Nem muito um lado, nem muito o outro, equilíbrio, pois se não tiver caímos a loucura. Loucura é falta de equilíbrio, mental, carnal, emocional e espiritual. A arte é um instrumento poderoso de cura e de prevenção de doença. É saúde.

Numa cidade como o Rio de Janeiro, como exemplo, que utiliza a força para manter o que seria a ordem, vem a arte para desestabilizar essa ordem e mostrar uma possibilidade de pensamento e de uma forma de organização que ajuda a sanear a cidade com os melhores sentimentos. “A arte é a desordem que ajuda a reorganizar o mundo, não pode ser diferente... – Amir Haddad”. Realizar um encontro que fale de arte pública dentro de uma instituição de saúde pública, ainda mais um hospício, estando hospedados juntos como os internos, tendo contato com eles, nos força a entrar em contato e ter relação com esse espaço e ver que existe uma outra forma de proceder e contribuiu para reorganizar esse  mundo, mostrando um outro pensamento em contraponto com o pensamento vigente, permeado de camisas de força e remédios, como se só isso fosse possibilidade.

A cidade do Rio, como outras, estão doentes. As pessoas se encontram enlouquecidas, vítimas deste cotidiano imposto, não conquistado. Não precisamos estar no estágio em que se encontram os internos do Instituto Nise da Silveira para entendermos a loucura em que vivemos, ainda mais no período “de plena decadência em que vivemos - Amir Haddad”.

Falar de arte Pública é falar de saúde pública, de ações que contribuem para que políticas públicas para a saúde, educação e para a arte sejam construídas e estabelecidas. Não tem mais como continuar com as políticas atuais que se dizem públicas nos rótulos, mas que são privadas em suas linhas.  Existe um clamor por uma nova organização social que tem romper com as “camisas de força”, romper com as “cercas”, transgredir a  ordem estabelecida para enveredar uma ordem pública pública.

E assim como começamos, terminamos este primeiro dia, tocando, cantando e dançando, agradecendo aos deuses e orixás pelo inicio do encontro, pela presença dos convidados, dos participantes e pela lua cheia que iluminou a noite deste primeiro dia.

Herculano Dias


Segue texto distribuído no Evento Ocupa Nise 2014

A cerca estimula a desordem
Ordem Pública – Desordem Pública
           Qual é a ordem das coisas? Está tudo em ordem segundo uma lógica milenar, ancestral e inevitável?  Qual a ordem da natureza? Qual é a ordem, por exemplo, da física quântica?
           A Ordem numa escola, pública ou privada, será a mesma ordem de uma penitenciária?   Os alunos que se perfilam em ordem  para entrar ou sair de suas células-salas, estão cumprindo a mesma ordem dos prisioneiros  entrando ou saindo de suas celas-isolamento para o pátio de recreação?  Não haverá nenhuma diferença? Qual a diferença? Um corredor de passagem ladeado por celas-isolamento não se parece com um corredor ladeado por células-salas de aula?
          A arquitetura estabelece a ordem ou é a ordem que define  seus espaços de acordo com os valores humanos, ideológicos que a produzem?
           Qual a diferença possível entre uma cidade do sec. XIX e uma do sec. XXI?  Conseguiremos algum dia abandonar o sec. XIX quando tudo se intensificou e nos organizamos de uma maneira diferente?  Procurar uma nova ordem?  Mas será possível se encontrar uma possível nova ordem, mais justa e mais humana, sem  passarmos por momentos muitas vezes dolorosos, de desordem?
Será possível uma nova ordem nascer da ordem vigente (dominante)? Ou somente a desordem  poderá abrir horizontes para uma nova ordem?
É possível uma nova ordem sem desordem?
          As manifestações públicas que abalaram o Brasil, faz pouco tempo, estabeleceram um nível variado de desordens. As reivindicações se faziam ouvir ou  notar.  Obviamente  se percebia nos movimentos uma insatisfação com a ordem vigente, e um anseio por uma nova ordem. Novas possibilidades de ordenação ou organização social.

           Aquela desordem aparente tinha em seu interior germes de novas ordens.  Que sem estas manifestações não poderiam ser vistas nem ouvidas. Era a desordem que dava à nova ordem desejada alguma visibilidade.
           Foram, porem, tratadas como desordem, simplesmente. Se levantou um clamor nacional pelo pronto estabelecimento da ordem. Ninguém suporta a desordem por muito tempo.  E as forças encarregadas da manutenção da ordem, da ordem pública, foram chamadas a cumprir seu papel de mantedoras do “Status quo”.  Tudo foi abafado. A ordem, finalmente, foi re estabelecida. E nenhuma das reivindicações manifestadas nas ruas foi até agora atendida. Nenhuma. Jaz sobre ela o império solene da ordem.  Que veio acompanhada de nenhum progresso.
Na  “desordem” nosso coração se expressa, manifesta. Desejos ocultos e reprimidos aparecem e nos tomam de assalto. Sem antes mesmo analisarmos sua natureza, nós os sufocamos e procuramos esquecê-los. Em nome de que?  Da ordem.  Da  ordem pública e até  mesmo da ordem pessoal, subjetiva. Todos nós sabemos, que  lidamos com o movimento e a transformação,  que confusão ou caos, ás vezes,  se instalam em nossas mentes e corações  sempre que uma nova idéia,  ordem, pensamento vai se manifestar.
Brecht lembrava: a lua nova é sempre precedida de uma noite escura. Abafar a desordem  sem ouvir seus anseios  é o pior tipo  de totalitarismo  a que  estamos sujeitos no mundo que escolhemos  e criamos para viver.
Mantida prisioneira da ordem nenhuma verdade nova se revela.

A Arte e a Ordem
          A arte é a possibilidade de manifestação da nossa desordem interior. É também, a forma mais profunda de re - organizar o nosso  mundo. Não é a ordem do mundo que organiza a arte, mas sim a desordem da arte que reorganiza o mundo.

É  a transgressão que possibilita a evolução, uma nova ordem para as coisas.   Assim, o conceito tradicional e repressivo de “ordem pública” não é o melhor valor social para lidar com as questões das  Artes Públicas, que se realizam nas ruas e nos espaços públicos ,   de uso liberado para a  população.
            Hoje sabemos perfeitamente que aquele  policial que ali está é um representante  da ordem pública  e está  ali para mantê-la. Assim como sabemos , também, que  aquele artista ou grupo que está se  apresentando em praça publica parece ser um foco permanente  de desordem e arruaça.    Tanto que os policias ficam logo atentos.  Isto quando não agridem, ameaçam,  espancam os desordeiros que atrapalham a ordem pública.  Para lidar com estes artistas públicos e respeitar o seu trabalho seria preciso reconsiderar o conceito vigente de ordem publica, e, entender que, estes artistas  ocupando estes espaços talvez possam fazer mais pela ordem publica que os agentes de  plantão espalhados pela cidade,  reprimindo todo e qualquer tipo de manifestação que poderia  vir a incomodar os donos do mundo ordenado desta maneira.

           Será preciso reconhecer que  existe  uma  forma superior de organização social que poderá modificar o conceito em uso de “ordem pública.   As “Artes Públicas” tem esta função desde a mais  remota ancestralidade do ser humano. Arte, medicina, religião, tudo junto ajudou nossos antepassados a avançarem.  Nas sociedades modernas, este papel e esta função das artes foram se modificando e desaparecendo por completo, ficando restritos  aos espaços fechados e aos que  a eles têm acesso.  Até chegarmos no impasse em que se encontra a produção cultural diante da  regulamentação do mercado.    E a arte que poderia organizar o mundo, como as festas, e celebrações, religiosas ou não, passa a ser substituída nos  grandes  aglomeramentos humanos pela policia. 
            Achamos que não podemos prescindir de policia nas ruas. E das artes nas ruas? Podemos? Não será possível pensar uma cidade onde o lúdico, prazeroso, a convivência urbana de qualidade, o humor, a criatividade, a poesia e a beleza dividissem com os “representantes” da ordem  a  organização e a reorganização permanente do mundo? 
Uma nova ordem pública para uma possível  Arte – Pública.
           São  muitos os artistas  que escolheram os espaços públicos para se manifestar, que  no entanto se encontram sufocados,  reprimidos  pela necessidade da manutenção da ordem  a qualquer custo. 
               Se não houver espaço para a  “desordem” que reorganiza o mundo constantemente, teremos muitas dificuldades em  pensarmos um modelo novo de cidade e convivência urbana que nos tire do sufoco em que  vivemos hoje em nossas cidades, grandes ou pequenas.
              Por isso, achamos que uma boa política Pública para as Artes públicas, deveria também colocar em questão a “Ordem pública” tal qual a entendemos até agora.
             Estimular as Artes Públicas, poderá  modificar nosso conceito do que é “Ordem Pública”.
             O diálogo com as Secretarias de Cultura e da Ordem Pública deveria  ser permanente, sem  predominância,  é obvio, do  pensamento policial.
“ Tudo está no seu lugar, graças a Deus, graças a Deus. Não devemos esquecer de dizer, graças a Deus, graças a Deus!”

AMIR HADDAD

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Pequena reflexão em tempos de encruzilhada

Adailtom Alves Teixeira[1]

O que se pretende aqui, nesse pequeno texto, sem esgotar os pontos tratados, é fazer uma reflexão sobre os rumos do país, tomando a pauta econômica e o bojo cultural do período eleitoral, em que diversos absurdos foram veiculados pelas redes sociais, além de negar os avanços sociais, escreveram barbaridades contra homossexuais e nordestinos.

Encruzilhada

Não se tem dúvida que o Brasil e os brasileiros tiveram significativos avanços nos últimos doze anos. Por outro lado, do ponto de vista das riquezas, devemos avaliar esses avanços sempre em relação a quanto lucraram os dez por cento mais ricos, aí verificaremos que os ganhos das camadas populares são quase migalhas. Logo fica claro o quanto poderíamos ter avançado e o quanto ainda podemos avançar. Portanto, se o governo federal, capitaneado pelo PT, levou o Brasil a significativos ganhos, sobretudo no âmbito social, questões mais sérias, como a política econômica e as reformas necessárias, não foram encaradas pelo mesmo.

Por isso mesmo, hoje, estamos em uma encruzilhada: garantir os pequenos avanços, sem sabermos se continuaremos a avançar, já que a crise econômica tende a se agravar, ou caminharmos para um retrocesso, caso o PSDB venha a governar o País. Se, por um lado, o Brasil esquecido, que há décadas não foi olhado, teve vez e certa voz – basta ver o mapa de onde Dilma ganhou, Norte e Nordeste, principalmente –, por outro lado, uma onda conservadora se levantou naquela ala que não quer perder privilégios e na camada populacional que acredita que faz parte dessa mesma ala. Claro que, diante da atual crise do capitalismo, a direita vem se mostrando abertamente, como já frisou Frei Betto, em todo o mundo. Esse ponto é muito mais preocupante. Por isso mesmo os desafios do novo governo, mas principalmente dos movimentos sociais para os próximos anos: faz-se necessário a construção de uma força que modifique a sociedade de maneira estrutural. No plano econômico, é preciso um real enfrentamento e uma mudança de rumos.

Eric Hobsbawm, no artigo “Dentro e fora da história”, fruto de uma conferência na Universidade da Europa Central, em Budapeste, no ano de 1994, levantava a questão para os futuros historiadores sobre o avanço da intolerância e dos modelos de políticas econômicas seguidos pelos países ditos em desenvolvimento: todos seguiram o modelo neoliberal. O autor alertava que essa política não rendeu bons frutos, nem mesmo aos seus criadores, Reino Unido e Estados Unidos da América. E por aqui? Será que se fez o real enfrentamento da política neoliberal, como afirmam alguns? Estaríamos em um momento pós-neoliberal e sem alternativas à esquerda? Como construir uma força política que avance na direção da ampliação das conquistas? São realmente conquistas ou concessões? Questões para refletirmos.

Valores em disputa

No âmbito da cultura, a questão também pesa. Pois o que temos visto é um grande aumento do conservadorismo e uma perseguição às minorias. Por exemplo, não se conseguiu engajar os milhões de estudantes universitários, fruto de política inclusiva e/ou afirmativa, nos movimentos sociais. “A moral e os bons costumes da família burguesa” têm prevalecido e o avanço em direção a uma sedimentação cultural que inclua as novas demandas sociais, parece não ter rendido frutos. Uma das explicações é porque essas conquistas vieram, assim como outras políticas, pela via do consumo, enchendo ainda mais os bolsos dos donos de universidades privadas e fortalecendo ainda mais a privatização do ensino. Importante ressaltar que toda mudança cultural é lenta, mas o horizonte não é alentador.

Ao misturar os aspectos culturais e econômicos, temos um caldeirão de absurdos. E é aí que aparece o lado mais tenebroso, pois parte do país que nunca havia sido olhado, acabou sendo achincalhado por grande número de pessoas que entende que o Brasil é apenas Sul e Sudeste, desenterrando uma cultura protofascista. Voltando a Hosbsbawm, o que ocorre aí, é que quando há decepção com o passado (nesse caso, recente, e sem os mesmos avanços nessas regiões), projeta-se uma decepção futura. Movimentos xenófobos e intolerantes buscam um culpado. Assim, se considerarmos a eleição da Dilma, vitoriosa no primeiro pleito, os grandes responsáveis por isso seriam, por exemplo (mas não o único), os nordestinos. Uma gente “esfomeada” que, segundo a concepção preconceituosa, não saberia votar.

A história é a matéria prima para as ideologias conservadoras. Logo, segundo Hobsbawm, “Se não há nenhum passado satisfatório, sempre é possível inventá-lo. (...) O passado fornece um pano de fundo mais glorioso a um presente que não tem muito o que comemorar”. Assim, a histórica região, onde sempre grassou a fome e os grandes índices de analfabetismo, continuaria a mesma. Cabe lembrar que a construção da ideologia perversa e preconceituosa, buscando no passado os elementos para sua construção não é sem fundamento histórico. Assim, como o Nordeste teria se caracterizado por uma história de violência do coronelismo (como se não existissem em outros lugares, inclusive no sul maravilha!), do voto de cabresto, bem como os já citados altos índices de analfabetismo e de fome, ali estaria a aberração, o erro. Que resulta em uma gente sem condições para exercer sua cidadania eleitoral. Dessa forma, se condena o território e as pessoas que nele habitam, duas vezes, como se elas não fossem capazes de reescreverem sua história, perpetua-se, assim, o passado no presente, ainda que mentiroso. O que se tem, aí, é a tentativa de substituição da história pelo mito. E mitos são essenciais na política de identidade.

A direita tem buscado construir um discurso preconceituoso, perverso e mentiroso acerca das minorias e daqueles que sempre estiveram à margem. É preciso disputar os avanços que se teve nos últimos anos também no âmbito da subjetividade, ainda que as ferramentas para tal sejam poucas. É nesse campo que atuam a arte, a educação, o sério jornalismo, entre outros. Sem avanços nos valores humanos, no entendimento de uma nova sociedade, não se pode lutar por mais avanços econômicos e sociais. Se a mudança material influencia a subjetividade, esta também modifica e impulsiona a realidade de forma dialética. Penso que a esquerda vem repetindo o erro ao não investir e trabalhar por uma mudança subjetiva efetiva em todo o corpo social, sem essa mudança abre-se espaço para que o mito se sobreponha a história.

Bibliografia
HOBSBAWM, Eric. Sobre história. São Paulo: Cia. das Letras, 2013.

Sites




[1] Professor da Universidade Federal de Rondônia; licenciado em história e mestre em Artes pela Unesp.

domingo, 5 de outubro de 2014

MEMÓRIA PRESENTE IV



“Não sou quem me navega, quem me navega é o mar...”. E no embalo da canção do mestre Paulinho da Viola, nossa nau chega ao Rio de Janeiro. A delegação que foi á Londrina volta para começar os preparativos para o encontro do Rio de Janeiro, na Zona Norte da cidade, dentro do Instituto Psiquiátrico Nise da Silveira, no Hotel da Loucura.
  
Pre-Produção

Como anunciado em Londrina, o encontro da RBTR se daria dentro do movimento Ocupa Nise, que entrava por sua terceira edição e que tinha como objetivo abrigar eventos relacionados á teatro, arte e saúde. Datas confirmadas: 01 á 07 de setembro, mês místico de transformações segundo antigas crenças pagãs.

Começamos a nos encontrar e fazer reuniões para dialogar sobre o encontro em 2014. Desta vez o Ocupa Nise estaria abrigando dois movimentos: o XV encontro da Rede Brasileira de Teatro de Rua e o IV Encontro da Universidade Popular de Arte e Cultura. Dois movimentos com suas identidades, mas unidos pela arte como instrumento de relacionamento com a cidade e como foco de saúde para a sociedade urbana. Arte Pública e Saúde Pública.

E foi em cima de um pensamento envolvendo Arte Pública e Saúde Pública que Amir Haddad, estimado, premiado e conceituado artista dos espaços públicos junto com Vitor Pordeus, médico e ator e criador do espaço Hotel da Loucura, conceberam uma programação onde os canais se abriam para falar sobre arte e saúde com celebração e com dialogo. Apolo e Dyonisius em sintonia e harmonia. E acontecendo dentro das paredes de um hospício, onde é fácil permitir ficar doente se não encontrar forças para essa harmonia.

O espaço físico estava lá, mas não queria dizer que seria fácil. Afinal, não seria apenas a UPAC que estaria ocupando os quartos da Casa do Sol, não, teria também a RBTR e o número de hospedes seria maior. O hotel da Loucura é apenas um andar, o terceiro do prédio onde se localizam enfermarias e baias para os internos e que na sua maioria encontrasse desativada, com poucos internos. Havia necessidade de  se expandir e foi o que aconteceu. A galera que administra o centro cultural de arte e cura, conseguiu anexar mais um andar, dispondo mais quartos e mais baias para a os articuladores e participantes que já estavam se inscrevendo para o encontro, já nas primeiras semanas o número já estava em 200 pessoas. O hotel da Loucura se expandiu dentro do Instituto, o que nos deu uma tranqüilidade, esta abalada por uma noticia que nos preocupou: a saída do secretário municipal de saúde Hans Donner, médico de visão e apoiador do projeto, que por motivos partidários e convicções políticas, se demitiu do cargo, sendo a pasta assumida por um nome da qual não tinha simpatia e interesse pelo trabalho realizado no Hotel da Loucura, mesmo ciente dos avanços que os internos que praticavam ali a arte do teatro, tinham conquistado. Primeira medida, o orçamento previsto para o evento, (R$100.000,00), já apalavrado e comprometido, foi cortado. Não vale a pena nem mencionar a justificativa dada pelo novo secretário, pois é a mesma que os burocratas dos serviços públicos dão para poder justificar em não gastar com o que eles acham como supérfluo.  Acham que o melhor para os internos de uma instituição para doentes com problemas mentais são remédios tranqüilizantes, camisas de força e grades. Pincel e grafite é bobagem.

A preocupação, o que fazer? Esmorecer? Cancelar o Ocupa Nise? Faltando pouco mais de um mês? Não podíamos aceitar tal derrota, afinal o evento era mais do esperado ainda mais onde iria ser realizado. Intensificamos nossa labuta. A galera dos coletivos que tem espaço e produzem no Hotel da loucura, junto com funcionários simpatizantes do projeto, internos e administradores do espaço, arregaçaram mangas e fomos para o tudo ou nada. Com muito esforço, passando o chapéu ou conseguindo doações conseguiram material.  Munidos de pincel, rolos, vassouras, rodos, panos e tinta, cantando, dançando e poetizando, limparam e pintaram o andar.
  
Enquanto isso, Vitor voou para Brasília para conseguir verba federal para o encontro. 

A tensão reinou nas semanas anteriores ao começo do Encontro Continuamos nosso ritmo, carregando o peso dos acontecimentos nas costas, com reuniões constantes no Engenho de Dentro, organizando o espaço, organizando as equipes de trabalho, se comunicando com os inscritos, vendo a melhor maneira de acolher a todos, afinal tínhamos apenas 160 e o número de pessoas querendo participar chegou a mais de 210. O que dizer, falar para os nomes na fila de esperaram não virem? É difícil de falar não quando a vontade é imensa. E com o peito escancarado e apostando que afinal de contas, nada iria dar certo, confirmamos todos os nomes.

No dia 30 de agosto começaram a chegar e no dia 01 de setembro já se encontravam dentro do Instituto mais de 190 participantes. Sabíamos dos riscos, apostamos na liberação da verba, depositamos nossos nomes em confiança, com promessas de acertos; incentivamos as pessoas a virem para o encontro, sem medo. O resultado, todos sabemos: ninguém ficou de fora, ninguém ficou desabrigado e ninguém ficou sem comer, ninguém ficou sem participar. Total de hospedados no Hotel da loucura, 210. Total de participantes em todo o evento, 400 pessoas.

Dia 07 de setembro, encerramento, lágrimas de emoção e alegria. Desistir nunca, render-se as tempestades jamais.  Dever cumprido.

Nas próximas páginas, o desenrolar dos acontecimentos, dia após dia do Ocupa Nise 2014.


MIRIAM NÃO DESISTE

Tensão no ar com problemas para serem resolvidos. Setembro chegando e nós da produção com a cabeça a mil, sem verba e tendo tanto a fazer, começando por preparar e, limpar e organizar o quarto andar para os participantes ficarem acomodados?

No meio de tantas questões, preocupações e debates, Miriam, interna do instituto Nise da Silveira e atriz do Grupo Dyo Nises, com a maior simplicidade, chega e fala:
“Vou vender muita empadinha e ai o dinheiro que der eu dou pra comprar tinta pra pintar os quartos e ai receber todo mundo e bem...”

Silêncio. Aos poucos as vozes retornam:
“Enquanto não pinga dinheiro no chapéu, vou ver se tenho tinta sobrando!” “Eu acho que tenho branca...” “A gente pede vassoura emprestada para limpar os andares.” “Vamos fazer escala? Eu posso vir de manhã, quem pode a tarde?”, “Eu posso.” “Coloca meu nome também...” “Mutirão, eu consigo jornal para não pingar tinta.” “Vamos arrumar o chalé, dá para o pessoal se alojar lá também.” “Lembrei que tenho azul sobrando...”

Vale mais um incentivo do que demonstração de impotência e inércia. Uma frase sem comodismo, movimenta uma multidão.

Herculano Dias